Economia fiscal em tempos de pandemia: limitação da contribuição ao sistema “s”.

Por Bruno Mendonça

Em março de 2020 foi finalmente pacificada, pela 1ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (Recurso Especial 1.570.980/SP), questão relativa à base de cálculo das contribuições parafiscais recolhidas por conta e ordem de terceiros, tais como o salário-educação e as contribuições destinadas ao INCRA, ao SEBRAE, ao Fundo Aeroviário e ao chamado “sistema S” (SESC/SENAC, SESI/SENAI, SEST/SENAT, SESCOOP, etc.). De acordo com a decisão unânime, a base de cálculo da exação deve se limitar ao valor de até 20 (vinte) salários mínimos, o que importa reconhecer a absoluta rejeição à atual orientação dos órgãos arrecadadores, os quais, em regra, exigem o tributo sobre a integralidade da folha salarial, sem qualquer restrição.

A discussão repousa sobre a interpretação de duas normas em particular.  A primeira delas, lei 6.950/81, prevê em seu artigo 4º, parágrafo único, que a base de cálculo das contribuições parafiscais arrecadadas por conta de terceiros deve respeitar o limite de 20 salários mínimos, em equivalência ao teto aplicado às contribuições previdenciárias. A segunda lei, por sua vez, deu forma à controvérsia. Com a publicação do decreto-lei 2.318/1986, o limite do imposto previsto na lei 6.950/81 foi revogado para o cálculo da “contribuição da empresa para a Previdência Social”.

A União, em arbitrária iniciativa, passou a sustentar que as contribuições parafiscais estariam atreladas ao financiamento da Previdência, razão pela qual subentendida estava a revogação do art. 4º, parágrafo único, da lei 6.950/81. Os contribuintes, por sua vez, insistiam no argumento de que o art. 3° do decreto-lei 2.318/86 havia revogado o limite imposto pelo art. 4° da lei 6.950/81 tão somente para as contribuições previdenciárias, não se estendendo às contribuições parafiscais.

A despeito das três décadas de discussões nas searas administrativa e judicial, a matéria jamais recebeu a repercussão merecida, mesmo diante do inegável impacto da contribuição sobre o orçamento fiscal das empresas, equivalente, em média, a 5,8% da folha salarial. A isso se deve a, até então, consolidada jurisprudência defensiva, fortemente marcada pela orientação pró União.

Em um exemplo hipotético, é possível visualizar o impacto das diferentes interpretações em uma empresa sujeita ao lucro real, com 200 funcionários. Suponhamos que cada funcionário receba o piso salarial, correspondente a R$ 1.045,00, e a empresa recolha 5,8% sobre a folha salarial integral. Neste cenário, a empresa recolheria ao longo dos últimos 5 anos (considerando o salário inalterado durante todo o período) o equivalente a R$ 60.610,00. Suponhamos agora que o teto de 20 salários mínimos fosse respeitado, ou seja, a alíquota de 5,8% tenha incidido apenas sobre R$20.900,00. Nessa hipótese, o tributo recolhido em 5 (cinco) anos seria de R$ 6.061,00, o que representa uma diferença superior a 54 mil reais.

É neste contexto que a decisão da 1ª Turma do STJ, de relatoria do ministro Napoleão Nunes Maia Filho, se firmou como importante precedente para as empresas que queiram recuperar o valor a maior pago nos últimos 5 (cinco) anos, bem como deixar de pagar as referidas contribuições vindouras acima do teto de 20 salários mínimos. Seis meses após a histórica decisão do Egrégio Tribunal Superior, o saldo é de centenas de decisões liminares e sentenças em benefício dos contribuintes, o que soa particularmente reconfortante em tempos de tamanhas incertezas e orçamentos combalidos.