Por Welson Matos
É comum ouvirmos que a sociedade empresarial – especialmente a limitada – em muito se assemelha ao compromisso assumido no casamento. E isso se dá em diversos aspectos, que vão desde a necessidade de se acertar na escolha do “parceiro”, até a necessidade de que a relação seja duradoura, confiável, e que efetivamente resulte em benefícios e crescimento para ambas as partes.
Em grande parte, essa semelhança decorre do que conhecemos como affectio societatis que, em rápidas palavras, é o elemento que embora seja subjetivo, deve ser intencional, demonstrando a vontade do sócio de contrair a sociedade. Em outras palavras, tal elemento pode ser traduzido em dois componentes, que por si só representam o duplo aspecto que permeia a relação: Confiança e Fidelidade.
Com o passar do tempo, essas semelhanças tornam-se cada dia mais notáveis, inclusive no tratamento que ambos os institutos recebem do Poder Judiciário.
Para não ficar apenas no campo das ilações, vale relembrar importante decisão proferida no início deste ano (2020) pela Juíza da 3ª Vara da Família da Comarca de Joinville/SC, a qual, antes mesmo da citação do cônjuge requerido, decretou liminarmente o divórcio pretendido, sob o argumento de que “estamos diante de um direito previsto no texto constitucional, do direito incondicionado de se divorciar”. Bastando, para sua decretação, o único elemento exigível, qual seja, a manifestação de vontade de um dos cônjuges.
Por sua vez, no Direito Empresarial, nosso foco neste momento, o Poder Judiciário tem adotado entendimento parecido – para não dizer idêntico –, como se nota em recente decisão, também de caráter liminar, proferida pela 2ª Vara Empresarial e Conflitos de Arbitragem do Foro Central de São Paulo/SP, em Ação de Dissolução Parcial de Sociedade.
Na supramencionada decisão, o magistrado consignou que, “providenciada à notificação prevista no art. 1.029 do CC, perfaz-se a retirada do notificante, restando pendente apenas a regularização de sua saída que a sócia dissidente.”
Nesse sentido já se manifestavam os doutrinadores pátrios, definindo que a retirada do sócio “corresponde, em termos genéricos, ao direito que tem o sócio de voluntariamente deixar a sociedade. Em termos específicos, retirada é o direito que tem o sócio de resilir unilateralmente, ou seja, de denunciar sua relação com a sociedade, mediante o recebimento do reembolso de sua quota. Trata-se de ato unilateral, potestativo e receptício. É unilateral porque a iniciativa depende apenas de um dos lados da relação, no caso o sócio retirante. É potestativo porque sujeita a sociedade ao arbítrio do sócio. E é receptício porque seu aperfeiçoamento depende do recebimento da notificação de retirada pela sociedade, que não tem o direito de se opor” (Marcelo Guedes Nunes, in Tratado de Direito Comercial, coordenado pelo Professor Fábio Ulhoa Coelho, v. 6, pp. 230, São Paulo, Saraiva, 2015).
Destaque-se aqui, que nem mesmo a oposição dos demais sócios ou da sociedade possui o condão de alterar a decisão já manifestada pelo sócio dissidente. E isso se dá porque “a eficácia do direito de recesso, uma vez notificada a sociedade, não pode ser obstaculizada por qualquer ulterior deliberação da sociedade, inclusive por aquela que venha a decidir pela exclusão do próprio retirante” (FONSECA, Priscila M. P. Corrêa. Dissolução Parcial, Retirada e Exclusão de Sócio. São Paulo: Editora Atlas, 2012. p. 11.).
Trata-se, então, de método interpretativo praticamente literal do quanto disposto no art. 1.029 do Código Civil Brasileiro – “Além dos casos previstos na lei ou no contrato, qualquer sócio pode retirar-se da sociedade; se de prazo indeterminado, mediante notificação aos demais sócios, com antecedência mínima de sessenta dias; se de prazo determinado, provando judicialmente justa causa.”
Mencionada decisão cristaliza o entendimento segundo o qual, o direito legalmente garantido ao sócio de, em assim o querendo, retirar-se da sociedade a qualquer tempo, constitui direito potestativo, restando à sociedade e aos demais sócios tão somente a sujeição à vontade externada.
Importante consignar, por fim, que a retirada do sócio nos termos mencionados, embora não possa, ao menos em tese, ser obstada pelos sócios restantes ou mesmo pela sociedade, não o exime das obrigações e responsabilidades societárias, nos moldes legalmente estabelecidos.