ANTECIPAÇÃO DE FERIADOS COMO MEDIDA SANITÁRIA – ASPECTOS TRABALHISTAS

Por Caio Gonçalves

A disseminação descontrolada da Covid-19 na cidade de São Paulo, a sobrecarga no sistema de saúde e a necessidade de elevar o índice de isolamento social na capital paulista acabaram por demandar o anúncio pela prefeitura, tal como feito em maio de 2020, da antecipação de cinco feriados municipais, dois dos quais previstos para 2021, enquanto os demais em 2022, com o escopo de criar um lapso de dez dias seguidos não uteis (de 26 de março a 04 de abril).

Até o momento, esta antecipação de feriados não foi formalizada. Vale lembrar que feriados municipais são decretados por lei municipal, aprovada pela Câmara Municipal e sancionada pelo prefeito. Desta forma, se seguir o rito utilizado em 2020, a proposta de antecipação de feriados municipais teria que ser votada pela câmara municipal da capital paulista. Entretanto, independente do meio jurídico que vier a ser adotado pela prefeitura de São Paulo, dificilmente haverá tempo hábil para questioná-la judicialmente.

Desta forma, a opção mais segura para as empresas é reconhecer a validade da antecipação dos feriados e, à vista do fato, se organizar em relação à manutenção de suas atividades, conforme o segmento, como no caso daquelas que atuam em atividades essenciais.

De largada, importa esclarecer que a lei trabalhista não proíbe o trabalho em feriados. Em circunstâncias tais, a CLT prescreve, como regra geral, que a jornada de trabalho em feriado é extraordinária, fazendo jus o empregado à remuneração das horas extras trabalhadas acrescidas de adicional de 100% do valor da hora normal.

Entretanto, a reforma trabalhista de 2017, incluiu o paragrafo sexto ao artigo 59 da CLT. Citado dispositivo autoriza a troca do feriado por outro dia, desde que a compensação se dê no mesmo mês, mediante acordo individual ou coletivo de trabalho. Em outras palavras, nesta hipótese o empregado trabalharia no dia do feriado, e então compensaria o dia trabalhado por meio de folga em outro dia útil do mesmo mês.

Evidentemente, na situação prática hora debatida, diante da quantidade de feriados municipais antecipados como medida sanitária, a inviabilidade da compensação de todos as datas antecipadas no mesmo mês. E sobre tal questão, bem como quase todas as demais relativas à pandemia, não houve tempo hábil para se consolidar entendimentos jurisprudenciais, de modo que sobra às empresas a cautela de agir mediante critérios de razoabilidade.

Nesse contexto, para as empresas cujas atividades sejam, conforme definido em lei, essenciais – tanto em função do produto e/ou serviço que disponibilizam para a sociedade, como também em razão da indispensável presença física do empregado e, por último, mas não menos importante, focando na manutenção do emprego com níveis razoáveis de segurança – resta o risco de propor aos empregados acordo individual de trabalho de compensação de feriado, mesmo que não compensados no mesmo mês, contudo, pautado em critérios de razoabilidade. Parte de referido risco pode ser mitigada pela propositura de data para compensação do dia trabalhado em tempo adequado, sem adiamentos excessivos da folga a qual o empregado fará jus, tão logo publicada a norma respectiva.

Ainda, algumas convenções ou acordos coletivos trazem disposições especificas sobre trabalho em feriado, banco de horas e compensação de feriados. Neste caso, cada empresa deve avaliar as disposições coletivas a qual esta sujeita, a fim de verificar se há impedimentos ou outras possibilidades que viabilizem o trabalho em dias de feriados.

Contudo, é importante ter claro que a antecipação de feriados aqui debatida, tem natureza sanitária e visa reduzir a mobilidade e aumentar os níveis de isolamento social.

Deste modo, a eventual decisão pela manutenção das operações, em especial para aquelas que demandam a presença de trabalhadores, deve ser ponderada caso a caso, conforme a função exercida por cada empregado no contexto das atividades da empresa, valendo lembrar que a contaminação de empregados no ambiente de trabalho – ou percurso – será tratada como acidente de trabalho. Em casos mais graves, onde haja redução da capacidade do empregado e/ou morte, a empresa poderá ter sua responsabilidade frente a ocorrência apurada, a partir da avaliação quanto ao atendimento das medidas sanitárias locais adotadas, frente a essencialidade das atividades mantidas.

Deve-se ponderar, ainda, o atual momento da rede hospitalar local, onde tanto a rede pública quanto a privada contam com poucas ou nenhuma vaga para atendimento de pacientes que demandem internação, seja em razão de uma doença qualquer, um acidente ou pela COVID.

Vale ter em conta que, mesmo num cenário de plena adequação do ambiente de trabalho à rigorosos padrões sanitários, tal, por si só, não garante igual sanitização para o ambiente externo à empresa, cujo trânsito é indispensável ao empregado que trabalha localmente, a exemplo dos meios de transporte envolvidos no deslocamento para ida e volta, o próprio prédio, estacionamento, ambientes de preparo de alimentação adquirida pelo empregado, serviços de entrega e até mesmo o contato do empregado com outros indivíduos e/ou entes familiares que também tenham de se deslocar, de modo que, toda circulação de pessoas potencializa a transmissão do vírus.

Por fim, vale ressaltar que embora este texto aborde a questão de antecipação de feriados na capital paulista, se aplica também a outras localidades onde medidas semelhantes também venham a ser adotadas.