REFORMA TRIBUTÁRIA GLOBAL E O PREMATURO FIM DO IMPOSTO SOBRE SERVIÇOS DIGITAIS

Por Bruno Mendonça

É pauta frequente nas discussões empreendidas pela nossa série de artigos que recobre as transformações provocadas pela economia digital, especialmente em matéria tributária, a implementação de um novo imposto sobre os serviços digitais, tanto no Brasil, quanto no restante do mundo. A medida vem despontando nos últimos anos como o recurso capaz de inserir a política fiscal no contexto da popularização da internet e de ressignificar conceitos forjados sob o império da velha economia. No último mês de outubro, com a anúncio do histórico acordo de taxação global mínima celebrado por 136 países, dentre eles, a integralidade da OCDE, da União Europeia e do G20, a questão ganhou novamente os holofotes e sob uma perspectiva ainda inédita. 

Há algum tempo a pretensão de implementação de um tributo compatível com a lógica digital perpassa os bastidores da cena política e midiática em âmbito mundial, mas apenas recentemente, impulsionado pela crise fiscal decorrente da pandemia da COVID 19, ganhou materialidade o plano de ressignificação de uma nova política tributária aplicável a economia digital. No Brasil, é possível apontarmos alguns projetos de lei que encabeçam o movimento, como o PL 2358/2020, que busca implementar uma Cide Digital, o PL 131/2020, que busca aumentar a alíquota de Cofins para serviços digitais e o PLP 218/20, que objetiva instituir uma Contribuição Social sobre Serviços Digitais (CSSD).

Em 2020, durante uma audiência pública virtual da Comissão Mista Temporária da Reforma Tributária do Congresso Nacional, o Ministro da Economia Paulo Guedes destacou a necessidade de acompanhamento da inovação tecnológica: “O imposto digital é uma coisa para nós conversarmos à frente. Mas é claro que a economia é cada vez mais digital. Netflix, Google, todo mundo vem aqui, o brasileiro usa o serviço. São muito bem recebidos, são belíssimas inovações tecnológicas, mas ainda não conseguimos tributar corretamente”, disse.

Todo esse movimento que se precipitava como questão urgente e inadiável ganhou, contudo, novos contornos com a celebração do acordo internacional de taxação mínima de multinacionais, com especial enfoque nas gigantes do mercado da tecnologia. Dentre os signatários do compromisso se encontra o Brasil.

De acordo com a proposta, um imposto mínimo global de 15% será cobrado das empresas multinacionais com receita acima de US$ 750 milhões, como forma de evitar a transferência dos lucros ou operações para países com baixa ou nenhuma tributação, popularmente conhecidos como paraísos fiscais, fugindo, por conseguinte, da tributação em seus países de origem.

Os ministros de Finanças e presidentes dos bancos centrais do G7, grupo dos 7 países mais ricos do mundo, demonstraram apoio a mencionada “reforma tributária global”, e se valeram da taxação sobre Serviços Digitais como barganha para ganhar o apoio das próprias empresas submetidas ao aumento das exações.

Conforme comunicado divulgado pelo grupo em meados de 2021: “Providenciaremos a coordenação adequada entre a aplicação das novas regras tributárias internacionais e a eliminação de todos os Impostos sobre Serviços Digitais, entre outras medidas similares relevantes, em todas as empresas”, diz trecho da nota. Em resposta, o CCIA, grupo de pressão que reúne os gigantes da tecnologia dos Estados Unidos, se declarou satisfeito pela “obrigação clara de retirar todas as medidas de tributação dos serviços digitais” e pelo “compromisso de não introduzir estas medidas no futuro”.

Ao que tudo indica, portanto, a pretensão de inserção da política fiscal na nova economia digital, por meio da taxação sobre transações e serviços digitais, pereceu antes mesmo do seu nascimento, para dar lugar a uma composição que almeja frear a intensa e secular concorrência fiscal internacional. Quem será efetivamente beneficiado por essa mudança de curso e até quando a sanha arrecadatória sobre o universo digital continuará reprimida, são questões que só o tempo poderá dizer.