Direito empresarial e a crise econômica

Por Fábio Ulhoa Coelho*
20 Abril 2016 | 07h 59

As duas Câmaras Reservadas em Direito Empresarial do Tribunal de Justiça de São Paulo têm realizado um trabalho de reconhecida importância, com repercussões altamente positivas não somente para as partes envolvidas nos processos judiciais que julgam. O competente trabalho desempenhado por essas câmaras é importante também para toda a economia brasileira, à medida que a jurisprudência por elas formada estabelece uma diretriz segura e técnica para os empresários de todo o País tomarem decisões centrais em suas empresas.

No cenário de crise econômica por que passamos, cresce em importância a especialização judicial em Direito Empresarial.

A crise dá ensejo ao aparecimento de altamente complexos processos de recuperação judicial de grandes empresas. A especialização em Direito Empresarial é o único meio de garantir a previsibilidade e a congruência nas respostas que o Poder Judiciário deve dar nesses processos.

De acordo com a Serasa, em 2015 foram 1.287 novos pedidos de recuperação judicial, importe 55% maior que o do ano anterior. Em 2016, o quadro tornou-se explosivo: comparando os números dos primeiros bimestres deste ano e de 2015, o aumento é da ordem de 116%.

Destaco, contudo, que nesses números, mesmo impressionantes, não se consegue captar toda a dimensão do aumento do trabalho que atualmente sobrecarrega as Câmaras Reservadas.

Em primeiro lugar, porque eles medem apenas a quantidade de novos pedidos de recuperação judicial. Escapa-lhes, deste modo, o importantíssimo dado do aumento da litigiosidade em cada um desses processos (com o consequente incremento de recursos, incidentes, etc). Não se pode, ademais, esquecer que ainda está em curso a maioria das recuperações judiciais de anos anteriores.

Em segundo lugar, a frieza do assustador índice medido pela Serasa também não capta o aumento da complexidade das recuperações judiciais mais recentes, uma consequência também da crise econômica. Quanto maior o porte da empresa em crise que se socorre do Poder Judiciário, tanto maior será a dificuldade suscitada pelo seu processo de recuperação judicial.

Além do aumento quantitativo e qualitativo das recuperações judiciais, também certamente aumentou o número de litígios entre empresas, em decorrência das dificuldades geradas pela crise, sendo muitos destes da competência das Câmaras Reservadas.

Assim, em razão da crise econômica, a experiência reconhecidamente exitosa da especialização judicial em Direito Empresarial em São Paulo passou a demandar, passados tantos anos de sua implantação, alguns ajustes que viabilizem o aperfeiçoamento da especialização judicial.

Na verdade, em vista da dinâmica da economia, sempre será o caso de o Tribunal de Justiça de São Paulo monitorar as mudanças econômicas, a fim de implementar as alterações necessárias no funcionamento das Câmaras Reservadas. Para que elas continuem a desempenhar o importante papel que vêm tendo na economia nacional, precisam ser tão dinâmicas quanto esta.

Entre os ajustes a serem hoje implementados está, sem dúvida nenhuma, a exclusividade de atuação do desembargador componente da Câmara Reservada. Visivelmente, esgotou-se o modelo de acumulação e compensação, aceitável há mais de meia década, numa época em que a economia brasileira vivia uma de suas mais frutíferas performances.

Concluindo, se é verdade que todos nós, brasileiros, temos de nos ajustar para melhor respondermos aos ingentes desafios da atual crise econômica, isso também se aplica à especialização judicial. As Câmaras Reservadas precisam ser valorizadas e reforçadas, para que a Justiça paulista continue a prestar à economia nacional sua insubstituível colaboração, expressa numa orientação jurisprudencial segura, congruente e célere.

*É PROFESSOR TITULAR DE DIREITO COMERCIAL DA PUC-SP

(Fonte: Estadão)